A tomada de posse por Marcello Caetano deixou o povo expectante em relação à situação nacional que se fazia sentir. Preocupava o atraso de face a outras economias, a guerra em África e a abertura do regime em termos políticos.
Os ideais fascistas, outrora implementados pelo regime salazarista, desenharam os contornos da vida dos populares por cerca de meia década e fazem os nossos avós lembrar de como era viver num país onde predominava a guerra, a censura, a fome e a prisão àqueles que ousassem exprimir ideias discordantes às do regime.
Lembrar os anos que anteviram ao ano de 1974 é reviver uma ditadura que censurava, prendia e torturava. É lembrar o medo de a PIDE nos poder bater à porta por trazermos connosco um isqueiro sem licença, é lembrar que as mulheres não tinham direito de votar e é lembrar que poderíamos voltar a ver familiares e amigos regressar da guerra do Ultramar sãos e salvos.
Celebrar o 25 de abril, é lembrar e homenagear a bravura dos que, na figura de oficiais revoltosos, puseram termo a um Portugal antidemocrático, antiliberal, corporativista, colonialista e conservador, após várias insucessas tentativas.
Um golpe militar sem massacres oportunizou que a liberdade se memorasse nas ruas e que todo o país permanecesse em festa até ao 1º de maio, celebrado pela primeira vez em liberdade. Começara uma nova era para a portugueses e para Portugal, ao nível social, economia, justiça, saúde, educação e emprego.
A democracia permite que todos tenham direito ao emprego e com ele, o direito à greve. Abriu portas à criação de partidos políticos com ideais próprios e ao direito ao voto, por todos. Nasceu a igualdade homens, mulheres, todos temos direito às mesmas oportunidades.
A Revolução é assim, um sinónimo de libertação, mas será que ainda cumprimos o 25 de Abril? Passados 46 de anos de mudança será podemos proclamar a democracia?
De facto, podemos desfruir dos direitos e liberdades previstas na Constituição da República Portuguesa e assegurar que, na pessoa dos tribunais as relações sociais e económica se mantenham justas.
Apesar dos avanços, Portugal continua a ser uma nação muito débil e, por essa razão, o aumento dos direitos sociais, vai surgindo a passo lento. Há muitos factos que fortalecem esta premissa. Existe um fosso entre a liberdade esperada e a liberdade efetiva.
Em pleno estado de liberdade, só se verificou a liberalização do aborto em 2007, o casamento homossexual em 2010 e a adoção por pelos mesmos em 2016, por exemplo.
Apesar da consciencialização sobre estas matérias ter progredido, continuamos a testemunhar episódios de violência doméstica, de racismo, e de desrespeito pela orientação sexual dos demais.
Na economia também a balança está desequilibrada. Por anos consecutivos, as mulheres têm lutado para reduzir os valores da desigualdade salarial, que ronda os 14,9%. Verifica se também disparidades na distribuição do rendimento, intensificando o gap entre ricos e pobres, com repercussões na educação. Apesar de o acesso ao ensino ser aberto a todos, há muitos jovens que não têm condições para materiais educativos nem para prosseguir com os estudos.
A par da democracia, um dos maiores êxitos de abril foi a criação de um sistema nacional de saúde (SNS) para todos, mas, contrariamente ao suposto, ainda existem desigualdades no acesso à saúde. Ainda há quem não consiga “aviar a receita” na totalidade, tendo que fazer “um-dó-li-tá” para escolher quais serão os medicamentos escolhidos para habitarem lá em casa. Ainda há quem aguarde em sofrimento por uma consulta de urgência da especialidade. Há quem espere nos corredores dos hospitais para ser socorrido. Há quem simplesmente não tenha acesso ou não chegue a tempo da cura. E ainda há quem tenha que ter por termo à vida em outro país que não aquele que o viu nascer.
Pois é. Lamentavelmente, Portugal é um dos países com maior taxa de desemprego nas faixa etária dos 15-64 anos e, por isso com menos acesso a cuidados de saúde.
Voltando à interrogação, será que andamos a cumprir abril?
Este ano, 2020, festejámos a democracia de uma maneira diferente. Irónica, diria.
Confinados às paredes das nossas casas, sem poder abraçar entrequeridos, sem poder gozar a liberdade, não por oposição do sistema, desta vez. Toda a situação inerente ao Covid-19 levantou algumas celeumas, tem trazido à tona todas as fraquezas, enquanto sociedade e enquanto país.
É tempo de valorizar a liberdade enquanto direito, mas também enquanto dever. “A nossa liberdade termina onde começa a dos outros” e todos temos o dever de permitir que todos sejam livres e tratados como “iguais”. Porque, para sermos iguais não é preciso que todos tenhamos as mesmas oportunidades, mas sim que possamos ser iguais perante a mesma oportunidade.
É urgente que levemos o 25 de abril mais longe e mais a sério!
Ângela Meneses
Risk Market Freelancer
Vogal da JSD Amadora
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